terça-feira, 26 de outubro de 2010

Auto da Barca Revisited

Caríssimos,
Amanhã, quarta-feira, 27 de outubro, iniciaremos o ciclo de palestras sobre os livros de leitura obrigatória da Fuvest/Unicamp. Começaremos com o mais antigo deles: O Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente.
Como todos sabem (ou já deveriam saber...) o texto vicentino faz uma crítica a relevantes tipos de pessoa que habitavam a sociedade portuguesa no século XVI.
Eu estava aqui pensando no livro, quando me ocorreu cogitar quem seriam os passageiros de uma barca do inferno contemporânea.
Posso imaginar aqui a figura de uma moça, talvez de nome Geisy, estudante universitária que durante a vida fizera de tudo para obter fama e riqueza?
Ou, quem sabe, uma aluna de ensino médio tão vaidosa que, diante do grandioso espetáculo do saber promovido por seus professores, só tinha olhos para o seu espelhinho a refletir a própria aparência?
Ou um outro estudante, excelente, conhecedor dos mistérios do céu e da terra, louvado por seus raciocínios e palavras, mas que, por conta de sua arrogância e prepotência, desprezara aqueles a quem poderia ter ajudado e se distanciara daqueles com quem poderia ter aprendido a ser mais humano.
Não seria justo, certamente, prescindir de um personagem professor. Um professor que, apesar do discurso a favor da razão e da sensibilidade artística, mostrava-se como um garoto bobo ao fazer troça sobre os torcedores de determinado time de futebol, só porque o glorioso Corinthians ganhara por um a zero o clássico do final de semana.
...
 Poderíamos criar uma infinidade de novos personagens! Quais seriam condenados? Quais seriam salvos? (Eu tenho simpatia especial pelo personagem professor...)

Gostaria que vocês escrevessem sugestões de personagens e de diálogos com os barqueiros!
Embora eu tenha receio de que alguns comentários se tornem demasiadamente violentos - e aquilo que é para ser edificante e fértil se torne estéril e destrutivo -, prefiro correr o risco e incentivar a criação de algo interessante!

Fica desde já avisado que, se os comentários se encaminharem para a agressão pessoal, eu retiro todo o post.
Para evitar que isso aconteça, procure basear seu texto em tipos não restritos ao Mater. Outra alternativa é focar nos vícios morais, e não em uma pessoa que os manifeste. Você pode até se inspirar em uma pessoa específica, mas deve retirar dela os traços particularizadores que permitam identificar seu personagem exclusivamente como esta ou aquela pessoa.

Vamos ver no que isso dá...
À barca, à barca, houlá!
que temos gentil maré!

4 comentários:

  1. Diante de uma nítida "coisificação" humana, a concepção de uma barca hodierna torna-se impossível. Esta seria congestionada, pois são intensos os vícios morais que se elevam ao ponto do interesse, egoísmo, corrupção e que concretizam uma máscara em diversos seres humanos hipócritas. Não há parvos, há inúmeros fidalgos egoístas que demonstram atitudes e ideologias insignificantes, no entanto, vê-se o outro polo - dos marginalizados - que sobrevivem com o apelo, com a desmoralização a fim de proporcionar um significado próprio, espelhando-se em atitudes próximas de um fidalgo acomodado. Insiro-me em um contexto cor de rosa. Sou testemunha dos pensamentos mais petrificados, de um elitismo ao mesmo tempo contagiante e irritante e de uma ideologia torpe, dotada de influências interesseiras. Deparo-me, todos os dias, com ações deploráveis, meios de portar-se que descaracterizam a essência humana.
    Diante disso, poria em uma barca as figuras mais inimagináveis. Nela, a criança seria visível carregando Ipod´s, celulares, notebooks, além de um discurso puro – inocente -, no entanto reconhecidamente corrompido pelo apego intenso ao material e pela padronização evidente.
    Além disso, o jornalista também se enquadraria nessa barca, pois faz parte da máxima manipulação humana, utilizando-se de meios nacionais para implantar conteúdos - em sua maioria – nada imparciais, buscando uma influência e não uma reflexão.
    Outro personagem seria o empresário – dono – de Organizações Não Governamentais, pois se utilizam de discursos progressistas que almejam mudanças, no entanto, articulam métodos de acúmulo e aproveitam-se da ajuda dos poucos que temem o inferno.
    Por fim, inclui-se a sociedade como um todo. Desde o mais inocente ao mais imoral. Utilizo-me do professor como aquele que se faz com objetivos distintos do ensinar. Dos vestibulandos que priorizam uma concorrência a ajuda múltipla. Dos padres e bispos que escurecem a religião com os casos de pedofilia. Dos presidentes que se enquadram em guerras almejando progresso econômico. Dos civis que votam inconscientemente. Dos políticos que se inserem em uma descarada corrupção ou na compra de votos. Dos capitalistas, economistas que se importam majoritariamente com o lucro. Dos artistas que se vendem buscando reconhecimento... Trata-se de uma lista infindável, com exemplos múltiplos que cresce diariamente. Todos têm vícios morais, todos são representantes e todos entrariam em uma barca que, atualmente, representaria um máximo de insignificância e imoralidade a qual o homem pode chegar.

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  2. "Hou da barca! Para onde is? Ah, barqueiros! Não me ouvis? Respondei-me! Houlá! Hou!..."
    Ah!Os interesses... Motivo da auto-destruição humana. Tanto física quanto psicológica. Pragmatizando-- da forma mais medonha-- a teoria Hobbeseana de " O Homem é lobo do Homem".

    Com efeito , seria acirrada a disputa por um lugar no batel do tinhoso. Até porque mais uma alma acaba de dirigir-se para tal

    Na embarcação infernal ...
    "Romeu Tuma! Você por aqui , querido!" Diz Getúlio Vargas.

    Não seria fácil aguentar o hipocondríaco José Serra. Ou , até mesmo , a peleguista Dilma Roussef. Os padres e pastores que o digam. Além disso , a música na barca do cornudo não é de tão boa qualidade.Pelo fato de que Homo sapiens sapiens (Não tão sapiens) como os da banda Restart lá estariam também. Fazendo dupla com a banda Fresno.
    Eu espero -- sinceramente-- que estes últimos sejam lembrados ,daqui alguns anos, como os responsáveis pela destruição cultural brasileira.Ah! Vale registrar também a presença do ,ilustre, Paulo Coelho.
    Não acaba por aí. Dá até para ver. No fundo do batel estão os donos do Brasil: Os latifundiários. Uma das piores crias do montro capitalismo.

    No barco angelical, as aranhas fazem as teias nos bancos.Vazios que só vendo. Algumas boas almas lá habitam. De um lado Lênin, Marx, Chico Buarque de Holanda e minha mãe. Como diz Veríssimo a história tem suas ironias. Quem diria, Marx está conversando com o anjo.

    As embarcações estão quase prontas para sair. Até que chega o -- querido -- Tiririca. Ele vai até a barca angelical e pergunta se pode entrar. O anjo nem olha para a face do palhaço. Este vai até a barca infernal. Lá também não pode embarcar. Pois, carrega toda hipocrisia nas costas. Terá que ir a reboque para o inferno.

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  3. Como em outrora postado, a teoria Hobbesiana de que "O homem é lobo do próprio homem" correlaciona-se gradativamente ao mundo hodierno. A guerra de todos contra todos torna o ser humano cada vez mais corpo e vontade não somente de sobreviver, mas de vencer.
    Discursos de engendramentos de uma sociedade justa, igualitária, foram banalizados pelo cotidiano, sendo este o responsável pela alienação, pela criação de uma rotina que nos leva à limitação.
    As personagens da primeira obra que retrata os costumes da sociedade brasileira, o cotidiano da terra inspiradora das cartas de Pero Vaz de Caminha, "Memórias de um sargento de milícias", são caracterizadas a partir de um relativismo social. A quebra do maniqueísmo romântico leva consigo a passagem para ingressar na barca das trevas, visto que é possível perceber o teor mínimo de ingenuidade, mesmo naqueles que encontram-se predominantemente na ordem.
    A ordem absoluta é, portanto, uma condição imposta para a salvação eterna.
    Coloco D. Maria diante das barcas. Esta encontrava-se cheia de pastas ingurgitadas de demandas e, ao dirigir-se à barca da salvação, o Anjo diz que não há espaço para "o seu vestido branco de cintura muito curta e mangas de presunto, o seu lenço também branco e muito engomado ao pescoço", nem para suas pastas. Dirigiu-se então à barca do Diabo, que estava bravo com as personagens que ali se encontravam, o Fidalgo e o Onzeneiro. D. Maria estabeleceu de imediato uma relação de amizade com o Fidalgo, porém admitiu uma repulsa inobliterável ao Onzeneiro. Os três embarcaram.
    Leonardinho, ao se deparar com a barca do inferno, viu a oportunidade de reascender sua infância, de relembrar travessuras feitas durante os cuidados do padrinho. No entanto, o Diabo o menosprezou, remetendo-nos à sua condição final de oscilar para a ordem burguesa. Foi para a barca do Anjo. Ignorado. Seu passado o condenava. Nesse momento conheceu o Judeu, que encontrava-se na mesma situação que ele. Precisaram ir a reboque. Leonardinho relacionara tal acontecimento com algumas de suas aventuras com o Sacristão da Sé.
    Em seguida, chegara o Mestre de Cerimônias, cantando, com uma espada de esgrima em uma das mãos. A outra mão acoplava-se à da Cigana. Ao chegar à barca do céu, o Anjo surpreendeu-se com a ousadia dele, que esperava ser perdoado de seus pecados mundanos, por causa de sua "dedicação" a Deus durante a vida. Teve subitamente suas expectativas desvanecidas. Conheceu, então, seu antigo companheiro de reza, o Frade. Ambos embarcam, contrariados e com suas amásias, na barca do Diabo.
    Maria Hortaliça, ao chegar, foi diretamente à barca do Anjo. Este, frio, condenou as atitudes da saloia durante sua vida, como o adultério. Ela, no entanto, procurou trâmites sexuais para persuadir o Anjo, que fora inflexível, assim como sucedera-se com a personagem que tentara estabeler um diálogo com o Anjo alguns minutos antes, uma alcoviteira chamada Brízida Vaz. Assim, Maria Hortaliça embarcara na barca do Diabo, este, que a recebera de forma prazerosa, assim como recebera Brízida.
    O Vidigal chegara convicto de que seu destino seria a salvação, ao cabo, não se lembrava de algo que pudesse condená-lo. Foi, então, falar com o Anjo. Lá encontrava-se o Enforcado, que foi morto pelo próprio major. Este último, entretanto, fora condenado pelo ato de ceder sua imagem pública à particular, ao estabelecer privilégios para o Leonardinho em prol das promessas de Maria Regalada. O Enforcado embarcou com seu mais novo companheiro de transcendência.
    Encontra-se em cena agora o barbeiro. Na barca do céu, chegara junto a ele quatro negros pertencentes ao navio em que ele atuara como sangrador. Por um acaso, ele sangrou os quatro. Porém, não foram condenados da mesma maneira. Os quatro negros foram destinados ao reino dos céus, por não terem, durante a vida, excessos, arrogância ou vícios. O barbeiro, por sua vez, teve seu julgamento condicionado pela trapaça em que aplicara ao capitão deste mesmo navio.
    Sendo assim, entrou na barca do inferno.

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  4. Ufa! ainda bem q não vi geógrafos na lista. rs
    belo Bih, adorei a intensidade

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