sexta-feira, 30 de março de 2012

4º lugar: Tormenta, de Igor Lopes Jadão sob o pseudônimo de Álvares Campos

Tormenta

Os largos pingos d’água dançavam ante minha face. Tal qual a chuva, as idéias me vinham á mente como os riscos aos meus olhos: corriqueiros.Tão ariscos quanto os pensamentos que tornavam-me a cabeça, uns mais reluzentes outros mais apagados.
Enquanto chovia, vinham os vapores do vento á minha face, doces, amargos, curiosos, sublimes dos mais vários tipos.
Até então, esse era o meio pelo qual eu tentava matar meu tédio, mas a cada golpe meu, ele levantava-se, ria incansavelmente de mim e voltava a divertir-se ás custas da minha sanidade.
Todavia, subitamente, restringi-me apenas a uma das várias problemáticas que me perturbavam. Eis que surge a alvinitente figura de mulher, a qual eu sobrepus imensas expectativas e sentimentos, e, por tal, tornei-a cada vez mais pesada tê-la comigo ao arrastar dos anos.
Não via nada, não pensava em nada, apenas afogava-me em minha melancolia ao remoer os perversos erros que permeavam minha mente. Percebendo que estava embebido por minhas frustrações e falhas, tentava desesperadamente agarrar esperanças que meus olhos caçavam e que apenas minha mente via. Por não haver nenhum suporte, era tragado ao fundo do gélido e medonho redemoinho do caos, onde encontrei a besta que gerei por alguns anos de omissão e vergonha.
Observando meticulosamente, percebi que não era propriamente um monstro, mas sim meu âmago surrado pela opressão de meus deturpados valores, implorando a mim que o liberta-se das pungentes amarras do medo e da relutância em revelá-lo.
A cada vez que trago à mente sua imagem e a meu corpo sua presença, tento manter a face austera. Tento reagir normalmente à presença dela, porém corre-me ao rosto uma dolorosa lágrima d’alma, as mãos ficam suadas e medrosas, tento pegar a ilusão do passado possível... nego o erro permeado por minha cabeça. Cada olhar, cada lembrança, cada gesto, torna-se uma adaga de culpa que fustiga-me à agonizantes golpes, e o sangue de cada apunhalada dada pelos fantasmas de meu passado, verte de minhas pútrefes entranhas, revelando os motivos obscuros pelos quais o erro se fez.
O silêncio mudo, frio e perfeito em minha boca omite toda a vontade que o espírito desesperado quer revelar: incertezas, palpites, alegrias e paixões não reveladas. Ah sim... as paixões... todas aquelas que divertem-se às custas da minha sanidade, quantas delas não morreram em silêncio dentro de mim...Quantas delas se tornam uma breve esperança num mar de opulentas dúvidas e medos... Com sorte, talvez ache a cura de tal mazela.  Tal martírio poderia ser evitado por pequenas palavras. Que fosse uma frase minha, talvez ''sim'' ou um ''não'' por parte dela, mas não, em vez disso fiz pelo silêncio e pelo medo. Mas toda essa maré de raciocínios e torturas são escondidas artisticamente pela minha personalidade e pelo diáfano de minha carne.
A chuva já cessou, todavia a angústia e o caos em minha mente custam a fazê-lo. A finas doses, a garrafa do remorso despejou-se em mim, e construiu uma gélida crosta de insegurança em meu peito que pressiona meu coração, expulsando dele qualquer sentimento áureo que busque abrigo. No que deveria preenchê-lo restam apenas as lágrimas da covardia amargadas pelo meu silêncio.
Os gritos de minha essência se perfazem por abrasoadas lembranças que aludem àquela figura transcedental de cachos negros. Ah sim os olhos....duas pérolas negras sobrepostas á mais nobre escultura de carrara, tão negros, tão vítrios e tão imprevisíveis. Tal rosto esculpido a finos traços tornou-se a única imagem que esvai minha mente de qualquer pensamento, de modo que eu pudesse ficar ali contemplando-a indeterminadamente. Mais bela imagem não poderia ser desejada, o seu toque era suave, emudecedor e de um calento ímpar, parecia eu, (mais ainda) uma criança sem fôlego ante tal contato.
Mora ela do meu lado, tão perto, tão distante. Assim passo a ser apenas um admirador invisível aos olhos dela, olhando sem nunca poder tocá-la, em virtude dos grilhões da timidez, e do medo da recusa.

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